O viajante
- Rodrigo Souza
- 8 de jun.
- 2 min de leitura

“Sois a terra da qual se alimenta o sonho do viajante. Sois o destino adorado, o peito adornado, onde dorme o amante”
Quando escrevi essas e outras frases, sabia eu que era para ela. Assim como hoje sei que o que ela escrevia era descrever-me sem saber como, sem saber porquê. E assim vivemos por um breve tempo. Num profundo e solene respeito. Um silêncio absoluto de respeito e reverência ao mais elevado tipo de amor. E posso dizer melhor, digo que seja o único tipo de amor verdadeiro existente. Que é o amor que se sabe um belo trabalho. Não no sentido capitalista da noção de trabalho. Não há como ser romântico dentro da lógica de mercado. Digo mais num sentido de artesanato, de uma manualidade, de uma intenção de amor e de amar. O amor-trabalho.
A possibilidade de intervir nos rumos da própria história e assim, estar totalmente implicado e responsabilizado de suas próprias escolhas, nada mais é que um ensaio de revolução. Há que se criar um espírito revolucionário, assim que você der o primeiro passo para revolucionar-se no espírito. Dentro de si, antes de qualquer guerrilha. Quando tu sabes que és tu o soldado de melhor mira, que quando olhas no espelho o alvo é o tiro, acerto-me, acertando-te. Sou o espelho quebrado, invertido. A esse desfecho repetido chamam de destino. Há, portanto, algo que as nossas insuficiências cognitivas e da ordem do léxico sentimental, nos limita chamar destino. E assim nomeamos, assim batizamos algo em nome do pai. Chamamos destino. E por assim dizer, acho sim que se trata de destino. Tu eras meu destino e não haveria outro destino de tanto que eu interviria, conscientemente, calculadamente, em quais esquinas eu te encontraria. Mapearia, como um serviço secreto de inteligência. Eu não te perderia de vista jamais. Eu sou aquele animal que fica imóvel por horas esperando a hora certa de caçar. E eu estou aqui. Nessa noite. Imóvel. Esperando você passar. E na hora certa. Na potência máxima dos músculos necessários para cravar as unhas, na fibra que te for vital. Mas não com o fim de te capturar como um bicho. Mas te ver livre e selvagem. Como um bicho. Livre. E selvagem.
Portanto, há sempre qualquer coisa a ser feita pela revolução. Sejamos realistas. Sejamos materialistas históricos. Há no amor um quê de suprimento para resistir a vida. Assim sendo, para que eu viva mais, viva melhor, viva em paz, é importante que eu ame. Importa o amor como munição para a realidade. Para nos fazer levantar pela manhã. Quem ama jamais pode ir dormir sem pensar em revolução. E assim ela nasce dentro. E assim ela engravida o amanhã. Pois ficamos férteis. Férteis de coragem para inventarmos um novo país. Um idioma próprio, comum, fraterno, de paz e sacanagem, de lealdade à revolução.
Sigo escrevendo para ti, pois sois a terra, sou o viajante, que chegou de longe. E viva a nossa revolução.
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