Um dia desses uma mulher muito que bonita, muito que jeitosa, muito que cheia de silêncios entrou. Muito - muito. Sabe? Ela era muito. Ela entrou e se sentou. Sozinha. Foi magnética em cada passo. E na pausa. E no silêncio. Não sei dizer se era só para mim que ela era muito e tudo isso, e mais coisas. Mas eu a olhava e via muito.
Ficou evidente no meu olhar que eu nunca tinha visto coisa igual. Era muita coisa ali e tudo era latente, pulsante. Delicadamente revoltante. Um caos organizado. Um improviso meticuloso.
- Como pode? Numa só pessoa, esse tanto. Pensava eu.
Se acompanhado estivesse de algum amigo o chamaria para olhar batendo com o cotovelo em seu braço. Olhando na direção dela, diria em meio tom: tá vendo!? Aquela mulher é muito.
E só dizer isso, porque nada mais diz. Nada consegue. Nada é capaz.
Mas muito o quê? Poderia perguntar o amigo. Eu responderia: é muito do que eu não consigo explicar.
Existem milhões de coisas que não sabemos explicar. Mas dentre essas coisas, algumas nós sabemos que não sabemos explicar, embora queiramos. Dentre essas tais, que sabemos que não sabemos explicar, estão as melhores coisas que queremos.
Um dos motivos de querermos é justamente por não sabermos explicá-las. Essas são as melhores coisas. Parece confuso, mas é possível ir além.
Vou tentar ir me fazendo entender. Prometo que não vou demorar pra chegar onde quero.
Há, ainda, as coisas que queremos por não sabermos explicá-las e aquelas que queremos não querer (por não sabermos explicá-las).
Ok, respire.
Eu entenderia se você voltasse no texto. Eu fiz isso também depois que escrevi. Tá tudo bem.
Já?
Calma.
Tem só mais um ponto.
E queremos não querer por que corremos o risco de que essas coisas (que não sabemos explicar e queremos) sejam capazes de explicar o que somos. OU como estamos exatamente naquele momento. E isso é assustador.
Me permita um exemplo a seguir. Juro que vai parecer mais simples.
Seria como explicar o universo. Nele, tudo quero. Sei dele muito pouco dizer.
De onde vem essa beleza iluminada, escura, lotada, caótica, silente, mortal, vívida, solitária, crescente, cheia de física e poesia? Alguns até saberiam explicar cientificamente alguns pontos. Eu - nenhum. Nem em teoria nem em encantamento.
Eu não saberia explicar essa coisa que cresce e segue sem fim como uma saudade. E se fosse possível chegar ao seu limite mais distante, mais estaríamos próximos de presenciar o seu fim e seu começo, e cada vez mais perto e mais longe tudo seria.
Se um dia todos soubermos explicar o universo saberemos todos quem realmente somos.
Eu poderia dizer a mesmíssima coisa dessa mulher. Ela é um universo. E eu não a sei explicar.
Me agarro à dúvida. Melhor do que ser explicado e entendido. E isso seria o fim.
Entendeu? Seria o fim do mistério.
Não entendeu, né?! Acho que nem eu.
É melhor não explicar.
Embora de fato essa mulher exista. Sendo essas coisas que escrevi não-alegóricas para se chegar a uma moral da história, digo com toda a alma: não a quero pra mim. Espero que ela nunca saiba quem eu sou. E que nunca me veja. E que nunca me leia. Pois tenho impressão de que ela saberia me explicar.
Não a quero para ninguém, também. Seria como colonizar o universo.
Eu só espero que ela siga sendo muito e sem explicação.
E que vá se expandindo como uma saudade. Se expandindo como um universo. E quando for possível chegar perto de seu limite, tudo seja perto e tudo seja longe, fim e começo.
Era tudo só pra dizer que te vi, mulher. Continue muito. Que tudo em ti continue inexplicável.
Nunca seja minha e nem de ninguém. A não ser que os queira explicar.
*Baseado em fatos irreais
Um segundo é o suficiente para ser eterno. O muito cabe em todo lugar, pois só se sabe o que é o muito, quando ele já está presente. Erra quem se diminui para o “muito” não poder entrar.